A previdência privada é um investimento de longo prazo e seus investimentos estão sujeitos a passar por muitos cenários diferentes na economia mundial e nacional. Ou seja, haverá momentos ruins e com rentabilidades não tão boas. E, atualmente, estamos passando por um momento ruim na economia, devido à pandemia do coronavírus (COVID-19).
Poderemos enfrentar, daqui pra frente, dificuldades financeiras e números não tão favoráveis. Mas, como comunicar e justificar isso aos participantes? Que argumentos utilizar? Como devemos explicar?
ESPECIALISTA EXPLICA
Conversamos com dois especialistas em investimentos e previdência complementar e obtivemos algumas explicações e reflexões sobre o assunto.
Arlete Nese: especialista em investimentos, doutora em Administração e sócia na ON Valor, consultoria especializada em governança e investimentos previdenciários, dentre outras experiências e especializações no mercado de previdência.
Everaldo Guedes de Azevedo França: Consultor de Valores Mobiliários e Administrador de Carteiras de Valores Mobiliários credenciado pela CVM. Professor dos programas de Investimentos da UniAbrapp para conselheiros e dirigentes de EFPC, dentre outras experiências e especializações no mercado de previdência.
Os dois responderam cinco perguntas que fizemos a eles. Veja as respostas:
1. Quais fatores fazem com que a rentabilidade dos investimentos seja baixa ou diminua?
Arlete:
São três os principais fatores que considero: a alta volatilidade dos ativos, a instabilidade dos mercados financeiros e o risco de liquidez dos investimentos. A instabilidade causada por um evento sem precedentes e de rápida abrangência global tem impacto direto não somente à saúde física, mas a saúde das empresas e de sua capacidade de geração de caixa no curto prazo. Os governos ao redor se fazem presentes para preservar a vida com palavras de ordem para isolamento e higiene. Não somente com medidas econômicas para assegurar a estabilidade da economia e garantir a liquidez no mercado.
Everaldo:
Basicamente, as oscilações desfavoráveis dos preços dos ativos, principalmente as ações. Também os títulos de longo prazo do Tesouro Nacional e títulos de crédito privado, como resultado da crise causada pela pandemia.
2. Numa crise financeira mundial, como uma entidade de previdência pode assegurar os investimentos? Quais medidas tomar?
Arlete:
É necessário ter clareza que o horizonte de seus investimentos é de longo prazo. Nesse momento, a evidência da alocação estratégica, devidamente fundamentada na projeção do fluxo de caixa do passivo bem como dos ativos, é condição necessária para manter a estabilidade da gestão dos investimentos. Assim, a alocação tática ganha destaque.
No acompanhamento constante do mercado, deve-se garantir a liquidez dos planos para honrar seus compromissos e, ao mesmo tempo, a boa remuneração para seu caixa. Como exemplo, a emissão do Novo Depósito a Prazo com Garantias Especiais – NDPGE. No longo prazo, as NTN-Bs voltam a oferecer taxas de juros de longo prazo maiores que há apenas algumas semanas.
Everaldo:
Ninguém nunca poderá assegurar preços ou retornos de investimentos. A melhor maneira de gerir uma carteira de investimentos de uma entidade de previdência é ter em mente o horizonte temporal em que os benefícios devem ser pagos. Também, construir uma combinação de ativos compatível com o prazo e o limite de risco que seja, ao mesmo tempo, necessário para objetivar os retornos necessários e suportável pela entidade e os participantes.
Devem-se tomar medidas de diversificação entre diferentes classes de ativos na construção das carteiras, de modo a enfrentar da melhor maneira possível momentos de turbulência. Uma vez instalada uma crise, há pouco a fazer, a não ser aproveitar para comprar ativos cujos preços tenham sofrido além do razoável. Apenas gestores de carteiras qualificados estão capacitados a fazer essas análises.
3. A previdência privada, sendo um investimento a longo prazo, está mais apta a superar crises como a que estamos vivendo?
Arlete:
Sim, e é importante destacar que esta afirmação tem como base duas principais diretrizes da Resolução do CMN 4661/18, a que estão submetidas as EFPCs. Primeiro, o dever fiduciário no estabelecimento e execução de política de investimentos sob critérios e requisitos, no interesse único no cumprimento do pagamento de benefícios a seus participantes e ao longo do tempo.
E segundo, a diligência devidamente evidenciada e a capacitação comprovada para gestão dos investimentos e controles dos riscos, tanto na gestão através de carteira própria quanto na terceirizada. Não somente isso, mas, a operacionalização da norma através de Instruções Previc, por exemplo, para gestão das carteiras através de perfil de investimentos e critérios, são considerados como mínimos para garantir a adequação aos participantes, a fim suavizar movimentações inadequadas em momentos como esse.
Everaldo:
Deveria estar, desde que o seu público compreenda a natureza de longo prazo do investimento e se lembre que as crises são passageiras. No longo prazo, os mercados se recuperam.
4. Para os participantes dos planos de previdência privada, é um momento de grande preocupação? Por quê?
Arlete:
Não e sim. Não, por dois motivos principais. Primeiro, porque a previdência privada observa diretrizes legais para alocação dos recursos, como expliquei há pouco. Segundo, porque os operadores do sistema e a própria fiscalização passaram por uma curva de aprendizado importante em pouco mais de dez anos. Mesmo que ainda distante do momento atual, houve crises no sistema que também nos proporcionaram a revisão da avaliação e controles de risco através de processos robustos, bem como o uso de práticas efetivas de governança, por exemplo, contra conflitos de interesses.
Por exemplo, a crise do subprime em 2008, onde veio à tona a questão de riscos subavaliados através de créditos hipotecários e que impactou as bolsas do mundo todo. E ainda, a crise aqui no Brasil deflagrada pelo forte esquema de corrupção em operações estruturadas de grandes empresas.
Sim, é de preocupação e na medida em que todos estamos vivendo um momento extremo e sem precedentes para reduzir as incertezas do futuro. É preciso resolver as questões de curto prazo, tendo avaliado as decisões que podem gerar um impacto positivo no futuro. Certamente, preservando as vidas e amenizando os problemas econômicos das famílias e empresas através de medidas do governo e cooperação da sociedade, teremos um cenário econômico favorável no futuro. E as EFPCs, em toda a transparência de sua gestão aos participantes de sua capacidade, para garantir a solvência e liquidez dos planos, são as que trarão a tranquilidade possível aos participantes da previdência privada.
Everaldo:
Qualquer perda, ainda que momentânea, no valor de aplicações financeiras, é preocupante. Os participantes de planos CD, com oferta de perfis, que escolheram perfis adequados às suas condições, estão em situações diferentes. Os já aposentados, que escolheram perfis conservadores ou superconservadores, sofrem leves perdas ou mesmo nenhuma.
Aqueles que ainda têm prazos razoáveis até entrarem no período de benefício, devem ter em mente que, no futuro, provavelmente os investimentos terão recuperado o valor perdido neste momento.
5. Que argumentos e ações as entidades devem utilizar para comunicar aos seus participantes as rentabilidades baixas?
Arlete:
Na crise do subprime, quando o mercado de ações do Brasil chegou ao fim de 2008 com prejuízo de 41,22% frente a 2007, houve os que argumentaram que essa era a causa da rentabilidade baixa dos planos na entidade e deram maior ênfase a este movimento negativo.
Porém, sem explicar se era mantida a situação de liquidez e solvência do plano, tanto pela estratégia que a EFPC vinha adotando pelas práticas legais como por práticas superiores, como o uso de comitês técnicos, qualificação e experiência profissional dos profissionais de investimentos etc.
O forte argumento é destacar a situação de equilíbrio em planos BD e, para os planos CD, como o impacto nas cotas tem sido suavizado pela rentabilidade obtida com a estratégia da entidade ao longo da gestão. É importante evidenciar a estratégia da entidade através do esclarecimento da política de investimento, dos limites legais, das premissas que determinaram e fundamentaram tecnicamente a alocação.
Explique o funcionamento do plano tático que preservam a liquidez e aproveitam as oportunidades segundo as alçadas competentes e pareceres fundamentados e documentados. Ou seja, deixe claro que estas são práticas que evitam o efeito manada para ações guiadas pela insegurança e desconhecimento. Nesse sentido, atenção especial aos planos com perfil de investimentos e processos que permitem migração sem a avaliação adequada por parte do participante.
O monitoramento e o controle adequados e segundo a orientação regulatória, é o que transforma a incerteza em porta para oportunidades. Por exemplo, a abertura das taxas das NTN-B longas para realocação de ativos do mesmo segmento e a emissão de Nova DPGE, que podem aliviar a remuneração de curto prazo. Por fim, precisamos ser ativos na comunicação com os participantes, no site da entidade, no canal de atendimento, em blogs, webinars. São ferramentas que, certamente, contribuirão para apresentação adequada do desempenho de seus planos e ações que estão sendo tomadas.
Everaldo:
O que foi mencionado na resposta à primeira pergunta: que os mercados estão em crise em função de um fator inesperado e imprevisível, mas que a crise vai passar em alguns meses e que o longo prazo trabalha a seu favor.
ORIENTAÇÕES PARA UMA COMUNICAÇÃO EFICIENTE
De início, é importante que a entidade siga alguns passos para manter uma comunicação transparente e efetiva com seus participantes, como:
- SITE ATUALIZADO E COM INFORMAÇÕES DE FÁCIL ACESSO
Mantenha, no site da entidade, as informações atualizadas e com acesso fácil. Em alguns sites, é difícil encontrarmos o histórico das rentabilidades do plano. Às vezes, encontramos algumas dificuldades, como:
- Só encontramos a rentabilidade acumulada do ano anterior;
- Não encontramos dados de mês a mês;
- Quando tem dados de mês a mês, os últimos meses ainda não constam – ficando, assim, desatualizado;
- Ter que dar muitos cliques até chegar na informação.
O ideal é evitar todos esses pontos, mantendo os números de mês a mês e dos anos anteriores.
- DIVULGAÇÃO EM MAIS CANAIS
Além de publicar no site da entidade, é interessante divulgar em outros canais de comunicação, reforçando a importância do participante em acompanhar esses números. Postagens nas redes sociais, envio de e-mail e até mesmo lista de transmissão via WhatsApp, são opções para e entidade comunicar.
O objetivo desses dois primeiros passos: quando o participante está constantemente atualizado, ele analisa uma linha do tempo de rentabilidades, não somente um período ruim. Dessa forma, ele consegue ver, claramente, que há momentos bons e ruins.
- PRODUÇÃO CONTEÚDOS EXPLICATIVOS
Às vezes, não basta apenas divulgar números, é preciso relatar motivos e explicar perdas. Para isso, invista na produção de conteúdos explicativos nos canais de comunicação da entidade. Produza blog posts, comunicados no site, posts para redes sociais, e-mails e/ou vídeos. Explique ao seu participante, de maneira clara e objetiva, o motivo de grandes perdas e de grandes ganhos, quando houver necessidade.
Dica: tenha sempre conteúdos explicativos atemporais e gerais. Por exemplo: a entidade pode colocar, na página das rentabilidades, a propaganda de um blog post que explica um pouco do mercado financeiro. Um material didático em que o participante poderá entender os motivos de rentabilidades negativas ou baixas.
TRANSPARÊNCIA E OBJETIVIDADE
- Não relate, apenas. Explique o motivo.“Por que a rentabilidade não alcançou a meta este mês?”
- Após explicar, apresente uma solução. “Este mês a rentabilidade não alcançou a meta, mas, estamos analisando novos investimentos de acordo com as tendências do mercado.”
- Faça textos objetivos. Foque em acrescer somente as justificativas e contextualizações necessárias para que o participante entenda de imediato.
- Evite palavras e expressões negativas, como “problema”, “ponto fraco”, “números ruins”, “maus resultados”.
- Mantenha a entidade disponível para dúvidas. É importante que o participante consiga tirar dúvidas com facilidade, seja pelo site, e-mail ou telefone. Certifique que sua entidade oferece acesso facilitado a esses meios.
Para mais dicas, veja o blog post do nosso diretor técnico, Tulnê Vieira, sobre venda de ativos na crise. Por que não vender? Clique aqui para ler.
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